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terça-feira, 7 de agosto de 2012

Tiago Ribeiro: «Exportar o jogador português para o Brasil? Estou doido para o fazer»

Tiago Ribeiro é o presidente da SAD do Estoril-Praia e o responsável pela Traffic na Europa. A empresa sediada em São Paulo é detentora de 74% das acções do clube desde 2010. Ao PÚBLICO, o brasileiro falou das contas e do futuro do clube, dos direitos televisivos e do mercado brasileiro.
Como estão as relações entre a SAD e o clube (formação)?
Estão muito boas, tínhamos avançado com o grupo desportivo [clube] no sentido de incrementar cada vez mais as relações e o aproveitamento dos atletas que saem da formação. No ano passado já tivemos três atletas no plantel, apesar de não terem participado na competição. A ideia é melhorar essa relação e desenvolver projectos mais ambiciosos na formação.

O primeiro objectivo foi alcançado: a subida de divisão. A partir de agora, tendo uma sustentabilidade na I Liga, consolidando a nossa posição na mesma, podemos começar a vislumbrar algum tipo de participação efectiva de integração e cooperação no desenvolvimento da formação com o clube.

A Traffic pretende valorizar o jogador brasileiro em Portugal, entrar no mercado…
Não, queremos valorizar o Estoril. O Estoril conta com jogadores de diversas nacionalidades, obviamente que os portugueses e os brasileiros são os alvos naturais, e principais, pelas qualidades de ambos, e também porque o brasileiro aqui em Portugal sempre teve mercado, não foi a Traffic nem o Estoril que inventaram isso. Os melhores jogadores da II Liga foram o Licá, que é português, e o Vagner, um guarda-redes brasileiro. 

Esse equilíbrio e valorização são consequência dos resultados, e aprendemos isso com alguns erros que reconhecemos, e que tivemos a humildade suficiente e visão para mudar nessa caminhada. Hoje, o Estoril é esse tempero: a mistura dos dois países.

Considera que, no primeiro ano, a aposta forte no mercado brasileiro foi um fracasso?
Eu não diria isso. Eu diria que foi uma necessidade no primeiro momento. Não havia tempo nem conhecimento para que pudéssemos fazer doutra forma. No segundo ano, foi talvez uma aposta arrojada, talvez errada, foi isso que se notou. E houve também a questão do treinador brasileiro [Vinicius Eutrópio] e a sua preferência em trabalhar com alguns atletas brasileiros que tinham muita qualidade mas falharam na integração e adaptação. No ano passado, chegámos a um equilíbrio certo, com a mudança no comando técnico [entrada de Marco Silva] e com a contratação de jogadores daqui, e mesmo de brasileiros que já jogavam em Portugal. Todos os jogadores pertencem ao Estoril e são, num primeiro momento, para desenvolver um trabalho desportivo e, eventualmente, se tiverem um desempenho muito elevado fazer resultados financeiros.

A Traffic pagou 200 mil euros para adquirir o Estoril, um valor residual, se notarmos que com a transferência de Jardel para o Benfica embolsou logo 300 mil euros…

A compra efectiva do Estoril e das acções foi um valor fixado no mercado mas isso é apenas o valor de compra. Por detrás de todo o processo de compra, existem todos os ónus que acarretavam a compra (dividas). A compra foi esse valor sim, mas trazia encargos do passado, com montantes muito mais elevados. Durante estes três anos de gestão e propriedade da SAD, conseguimos limpar todo esse passivo que havia para trás. Essa foi a principal acção da empresa.
O Jardel foi um atleta da primeira leva, no ano em que éramos apenas gestores. O Jardel nunca chegou a ser um atleta vinculado ao Estoril, até porque não éramos proprietários do clube. O Jardel foi uma operação que foi feita directamente com o Desportivo Brasil, que é o clube da Traffic no Brasil, embora a vitrina tenha sido o Estoril e depois o Olhanense.
Xandão [jogador do Sporting] é outro jogador da Traffic que está a ser valorizado em Portugal, fala-se até do interesse da Lazio. Quem decide o rumo das transferências? A Traffic em Portugal ou no Brasil?
Eu sou o responsável da Traffic na Europa mas nessas questões sou como uma ponte para o Brasil. Os casos de Xandão, Jardel e Ismaily [reforço do Braga] são geridos pela directoria da Traffic no Brasil e, evidentemente, com a minha participação.

A época de 2010/2011 não correu bem [10.º lugar]. O que aconteceu com Vinicius Eutrópio?
A falta de conhecimento do mercado. E, apesar de ter estado aqui uma temporada e cinco jogos, acho que ele teve dificuldades em conseguir adaptar o seu estilo ao de Portugal. É uma pessoa por quem tenho muita consideração, até amizade, mas para este projecto ele estava um pouco fora do contexto. Faltou-lhe algum jogo de cintura.

E porquê Marco Silva? Em meses passou de jogador para director desportivo e depois treinador…
Quando chegámos vi no Marco uma capacidade de liderança e inteligência acima do normal e ele percebeu logo a dimensão do projecto. Quando acabou a época [2010/2011], que não foi das mais bem sucedidas aqui, precisámos de fazer uma mexida na direcção, e decidimos que uma das medidas era que a montagem do elenco fosse feita de uma forma local, com a contribuição da accionista no Brasil, mas daqui para lá e não de lá para cá. Esse foi o principal erro na época anterior. E, por isso, chamei o Marco para assumir a função de director desportivo. Fê-lo de uma forma muito eficaz. Quando a época iniciou [2011/2012], já tínhamos algumas dúvidas sobre a continuidade do trabalho do Vinicius, mas quis dar-lhe uma oportunidade para ver se ele conseguia melhorar e adaptar-se. Como tal não aconteceu, percebi que a mudança técnica era essencial para que o projecto mudasse de rumo. Foi depois de um jogo, no caminho para casa, que me deu o “click”, quando pensava em nomes. E percebi que eu tinha essa pessoa à minha frente, dentro de casa, com todo o conhecimento do Estoril, com a minha confiança e com uma competência que já estava ali, talvez estivesse ainda uma pouco bruta, precisava só de ser aflorada, e deu o que deu.

Dizia-se que, se o Estoril não subisse, a Traffic abandonava…
Bom, não é totalmente verdadeiro nem totalmente falso. O que acontece é que o projecto tem de ter objectivo e retorno. Sempre frisei isso: a Traffic não tem pressa. Mas traçámos um plano, um objectivo, de alcançar a Primeira Liga para que o projecto possa ser viável por si só. Quando percebemos que não era tão simples assim, não que fôssemos sair, isso nunca foi hipótese, mas houve durante algum tempo algumas sondagens e pessoas que se aproximaram até, interessadas em assumir o Estoril. Nós nunca pretendemos evoluir nesse sentido mas talvez tivesse de haver uma mudança na forma de actuar, com os pés mais no chão e com mais controlo, uma politica muito mais austera mas não sair, até poderíamos procurar um parceiro, uma coisa que pudesse fomentar a viabilidade do Estoril mas jamais abandonar o barco. Uma vez eu disse e repito: o Estoril não é um brinquedo, como uma criança que quando se cansa mete o brinquedo no canto do quarto e vai buscar outro. Caso contrário, não teríamos comprado o clube, bastava apenas geri-lo [como no primeiro ano], se não desse certo, íamos embora, não tínhamos quaisquer responsabilidades patrimoniais.

Em que estado estava o Estoril quando a Traffic chegou?
Muito ruim, com dívidas muito altas. Eu acredito que estava em perigo de acabar ou de sofrer consequências nefastas para a continuidade do futebol profissional. O maior problema era a gestão do passivo. Foi tudo uma infelicidade a meu ver, e estou a falar do último accionista, João Lagos, uma pessoa por quem tenho uma estima pessoal muito grande e um respeito enorme. Temos uma relação muito boa, somos amigos, mas infelizmente ele teve dificuldades na gestão dos seus empreendimentos e o Estoril ficou à margem. Ele não teve estrutura, na altura, para administrar esse passivo. O nosso "timing" foi apertado mas deu tempo para conseguirmos gerir o passivo e apagar os incêndios mais urgentes.

O dinheiro está agora no Brasil, a lógica poderia inverter-se. Há alguma intenção de exportar o jogador português para o Brasil?
É uma coisa que estou doido para fazer. O Brasil é um mercado muito atractivo. Adquirir um jogador aqui e levá-lo para o Brasil é uma coisa que a Traffic e outros investidores talvez devessem fazer. Mesmo que não seja investindo, que seja simplesmente a colocação do jogador português no Brasil, porque o mercado brasileiro está realmente ´aquecido´. E eu, falando contra o Brasil, acho que há muitos jogadores brasileiros que estão ´enganando´, estão muito inflacionados. Já o jogador português, julgo que tem uma qualidade tremenda e pode chegar lá e fazer tão bem ou melhor que muitos jogadores brasileiros que estão com salários altíssimos. Mas isso é uma questão que o mercado vai ditar.

A Traffic tem jogadores em ascensão no Brasil?
Temos uma série de jogadores, principalmente formados na nossa Academia. Tivemos agora uns resultados expressivos na Milk Cup [torneio internacional onde entraram equipas como Benfica, Manchester United, Tottenham, CSKA de Moscovo, Newcastle, entre outros], inclusive um sonoro 6-0 contra o Benfica e fomos campeões em sub-17. É um torneio dos mais importantes na categoria, no qual vencemos o Newcastle na final. Temos jogadores jovens que têm vindo a integrar as "fileiras" do futebol brasileiro.

A Academia da Traffic em São Paulo impressiona. Há algum projecto semelhante para Portugal?
Muito embrionário, sim. Tivemos algumas conversas com a Câmara de Cascais para desenvolvermos uma área, não igual, mas semelhante à que temos no Brasil, exactamente para apostar no talento do jovem português e isso vai envolver também a formação do clube. Aqui em Portugal há uma vocação para acolher jovens talentos estrangeiros, e não só brasileiros, mas também jogadores africanos e europeus.

A Traffic também está nos Estados Unidos…
Temos um projecto que envolve a liga NASL (North American Soccer League). Somos os proprietários da maior parte do capital da liga, além de sermos donos do Fort Lauderdale Strikers e de termos participações noutras equipas que compõem a liga. Lá, a ideia é criar um modelo europeu para o 'soccer' e concorrer, entre aspas, com a MSL (Major League Soccer), que domina o futebol e tem um modelo universitário, como no basquetebol ou futebol americano.

Que outro mercado poderá interessar para colocar jogadores ou investir noutro “Estoril”?
Eu acho que estamos bem posicionados já. Em termos de clube e actuação directa, é este o modelo e, ainda por cima, o Estoril já alcançou a I Liga, onde queremos consolidar essa presença. Quanto a jogadores, a Europa está bastante coberta, este continua a ser o principal mercado. Abrimos também muitas frentes em mercados emergentes, como no asiático e no Médio Oriente.
Relativamente à negociação dos direitos televisivos, qual é o impacto num clube como o Estoril-Praia?
O impacto no orçamento do clube é muito forte. É a principal fonte de receita dos clubes. Sou completamente avesso à forma como tem sido abordado o tema. A Liga, o principal operador e actual detentora dos direitos [Olivesportos] e os clubes têm de se sentar à mesa. O que tem de ser feito é uma discussão ampla com a Olivedesportos, com o Joaquim [Oliveira], que tem todo o mérito de ter criado este negócio, com muita capacidade e competência. De um momento para o outro, algumas pessoas do futebol, que durante muito tempo não se queixaram de nada, vêm criar uma antítese dessa relação com o operador, acho muito nefasto e ruim, e isso cria um clima de desconfiança e de guerra desnecessário. O momento é para discussão pacífica para que se encontre um modelo adequado com os grandes. Ninguém existe sem os grandes. A minha opinião é que os grandes têm de continuar a ser cada vez maiores para que os pequenos possam crescer. Há pessoas que acham que os grandes têm de dividir e "jogar" para baixo, mas não, os grandes têm de "jogar" para cima e isso vai provocar um efeito-cascata (compras de activos, etc). Mas esta opinião está um pouco isolada.

O que pensa do processo da alteração à lei dos empréstimos?
É a mesma coisa: não houve discussão. A maneira como foi conduzida foi estapafúrdia, nas vésperas de fechar uma época, numa assembleia que se arrastou ao longo de uma noite. Essa questão foi colocada como um assunto diverso, não sei qual foi a intenção. Houve uma discussão breve [entre clubes] durante a própria assembleia e, de repente, aquilo já estava aprovado. Os empréstimos têm de ter regras. Fala-se muito em verdade desportiva e depois há hipocrisia. Se um clube empresta um jogador a outro clube, que se crie uma regra que permita que esse jogador não jogue. Acho também que devia haver limite de empréstimos por clube, tanto para quem empresta, como para quem recebe, independentemente de onde vem o jogador, porque não acho justo, por exemplo, eu aqui ter uma despesa elevada com atletas e acabo por competir com equipas com 10, 12, 15 jogadores emprestados e com uma despesa muito menor.

Aqui pensou-se muito nos "grandes" que emprestam aos pequenos, e esqueceu-se de pensar no contrário. Amanha, se o Benfica, Porto ou Sporting quiserem comprar um jogador do Estoril mas não têm a certeza que ele vai aguenta jogar num ´grande´, porque não emprestar? É um modelo viável, mais ainda na conjuntura actual, os clubes têm medo de apostar forte num jogador que não têm a certeza que vai vingar.

Perspectivas para a nova época? Que podem esperar os adeptos?
Trabalho. Muito trabalho e seriedade. Esperamos que o que temos feito na preparação se reflicta numa época tranquila, garantindo a manutenção, que é o nosso principal objectivo. Sem ela tudo pode ir por água abaixo.

Há pouco no relvado disse, na brincadeira, que pensariam num terceiro anel se o Estoril chegasse à Champions. É real pensar na Europa?
São muitos factores e muitas águas para passar por debaixo da ponte para que isso possa virar objectivo. Mas se conseguimos um percurso de continuidade, consolidando a nossa presença na I Liga, com uma política e gestão coerentes...

Tem alguma referência como modelo de gestão?
O modelo mais evidente de todos é o Sp. Braga. Nunca foi pequeno, mas também não era da dimensão que é hoje. Acho que a gestão que se faz no Sp. Braga é excelente. O Braga não comete loucuras, a politica de captação de jogadores é muito eficaz. Os meus amigos de Olhão também têm mérito. O Olhanense está consolidado na Liga e começa a ter sonhos de ir à Europa. No estrangeiro também há bons exemplos. Hoje não tanto, mas o Villarreal, um clube modesto, amarelo como nós, saiu donde saiu, de uma cidade pequena, quase como satélite do Valência, chegou à Champions League. O Lyon há 25 anos atrás era um clube de pequeníssima expressão. Há alguns bons exemplos por ai e temos tempo para chegar lá.

publico.pt

   



6 comentários:

Excelente!

Não concordo:
"Há pessoas que acham que os grandes têm de dividir e "jogar" para baixo, mas não, os grandes têm de "jogar" para cima e isso vai provocar um efeito-cascata (compras de activos, etc). Mas esta opinião está um pouco isolada."

Muito isolada?! Completamente isolada! Isso é como na sociedade, se damos aos ricos em vez de dar aos pobres não estamos a estimular a economia, pelo contrário, estamos a tirar poder de compra. Assim como os clubes que têm mais vão às compras fora de Portugal. Qual cascata? Não percebo. Só teremos mais "Bragas" quando a LPFP decidir tratar todos os clubes por igual e acabar com regras vergonhosas como os 3 'grandes' não se poderem defrontar nas 3 primeiras jornadas, quando houver uma entidade que controle o tempo de antena dada aos clubes nas tv's, é um atentado ao futebol português dar 30/40 minutos de análise a um jogo de um "grande" e depois se for preciso em dois minutos apresenta-se um resumo à pressa de outro jogo que não envolva um grande.


Concordo plenamente:
"Aqui pensou-se muito nos "grandes" que emprestam aos pequenos, e esqueceu-se de pensar no contrário. Amanha, se o Benfica, Porto ou Sporting quiserem comprar um jogador do Estoril mas não têm a certeza que ele vai aguenta jogar num ´grande´, porque não emprestar? É um modelo viável, mais ainda na conjuntura actual, os clubes têm medo de apostar forte num jogador que não têm a certeza que vai vingar."

Claro! Mas o problema é que não "pensou-se" muito nos grandes, mas sim "pensa-se" muito nos grandes. Antevejo uma 'luta' que vai ser este Tiago Ribeiro para os grandes e a LPFP. Estou confiante que vai ter um papel importante na mudança desta pobre mentalidade do futebol português obcecado por três clubes.

Este esclarecimente deve ser para rir Sr.Tiago, apostar na formação ou fazer com que os jogadores da formação desistam do futebol...tenha um pouco de bom senso e divulgue a realidade a formação para si não vale nada,você já teve melhores jogadores da formação que no plantel principal...só que todos sabemos que valores mais altos se levantam, brasileiros que nem se sabem posicionar em campo...leia bem o que diz, uma imensa mentira e por último valorize o jogador e não o poder. Consegue dormir com a conciência tranquila?? bem me parecia que não.

Finalmente temos um homem forte que vai "lutar" a favor dos "pequenos". Eu até percebi o que ele quis dizer quando diz que se os grandes aumentarem os pequenos também aumentam, mas acontece que em Portugal isso é completamente impossivel! Em Portugal, se os grandes aumentarem o fosso entre os grandes e pequenos vai ficar maior e não vai diminuir simplesmente porque o mediatismo tem muito peso e isto já está mais que viciado.

Tinha feito muito bem há uns anos o FC Porto ter descido de divisão por corrupção, assim mostravam a todo o mundo que afinal não há protegidos em Portugal, assim, pelo contrário, só provaram que não só há protegidos, como também há favoritos!

Enfim, mas o Tiago está a fazer um bom trabalho e é inteligente, vai perceber isto tudo daqui a um tempo.

Temos Homem
Tem um rumo, uma estratégia um objectivo e mais importante parece ser honesto e competente.
Estamos na presença de alguém que pode valorizar a historia deste enorme clube.
Desejo-lhe as maiores felicidades e espero que todos os Estorilistas se unam para podermos ajudar nesta caminhada

Já imagino o hino da champions a tocar no Coimbra da Mota!! LINDO!!! :D

Grande Tiago Ribeiro FORÇA ESTORIL!